Finados

A morte é um tema que sempre me deixou extasiado. Histórias sobre essa famigerada eram minhas preferidas na infância. Uma delas me tocava profundamente: a existência de um povo por aí que chorava quando alguém nascia e promovia a maior festança quando alguém morria. Era o trágico subordinado a alegria.Não chego a ter esse comportamento, necessariamente. A comparar com as pessoas que me rodeiam, contudo, sinto-me meio que deslocado. A morte não me amedronta; só quando ela rodeia meus amigos, parentes e conhecidos que me descabelo.

Talvez seja isso um exemplo perfeito para ilustrar a teoria de Morin sobre a morte. Quanto mais forte a individualidade do outro esteja presente sobre a nossa, maior a violência da perda. Por isso ninguém se esquenta com a morte de um vizinho pé-rapado qualquer e se comove profundamente com o obituário de alguma estrela. Assim, a morte é muito mais um evento social do que um mero fato biológico.

Para Lewis Mumford, renomado historiador estadunidense, foi esse evento social um dos principais influenciadores na sedentarização do homem. Os nômades sempre retornavam aos locais onde haviam parentes enterrados. Esses lugares, apropriadamente denominados de necrópoles, deram origem às primeiras gerações de cidades. Curiosamente, as cidades dos mortos deram origem as cidades dos vivos.

Partindo do vivido, e não do concebido, o geógrafo paulista Eduardo Rezende estudou os múltiplos usos do cemitério. O objeto de pesquisa foi o cemitério de Vila Formosa. O autor é um exímio conhecedor dessas áreas. Mais de 400 receberam sua visita. Em Metrópole da morte, Necrópole da vida, Rezende mostra que existe sim vida nos cemitérios. Nem que seja para empinar pipas e soltar balões.

E assim, a alegria subverte a tragédia da morte, do fim, mais uma vez.

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