Taxonomia de Julian Bloom

Um dos primeiros post’s que li no excelente blog do Afonso era sobre a deliciosa e difícil convivência entre os colegas de profissão (esse, especificamente, foi publicado no dia 02 de agosto). Entre aqueles que tem o trabalho desenvolvido de forma essencialmente coletiva, essa convivência ainda é mais ‘turbulenta‘.

Já luto contra a tentação do ócio por quase uma década, sempre em funções eminentemente públicas. Nesse tempo, tenho catalogado muitos coleguinhas que são, hum, trabalhosos. A maior parte de meus pares, no entanto, me deixou uma incontida saudade. Os outros – apesar de serem genericamente ‘outros’ – se subdividem em classes e subclasses numerosas – afinal, o bom é sempre bom; o mau é mau cada qual a seu modo… Resumidamente, consegui vê-los (ah, como em um filme…) em sete tipos especiais:

1. “Sossegado”: Dê-lhe um susto e espere vê-lo gritar semana que vem. Morte súbita como causa mortis é algo impensável. Dialogar com esse tipo é um verdadeiro exercício de paciência. Não raro, aproveita desse aspecto cândido, digamos, para se escorar nos colegas. É mestre em morcegar.

2. “Caladão”: não te explica nada sobre aquele serviço a ser feito, mas olha com bastante interesse seu desenvolvimento. Jamais fala o que pode estar certo ou errado DURANTE O TRABALHO. Quando terminado, receita um punhado de defeitos que aconteceu. Esconde-se sob uma carapaça mal humorada. Nunca espere cooperação desse sujeito.

3. “Curioso”: quer saber de tudo o que você está fazendo. Possui uma curiosidade mórbida. Para quem está de fora, até dá por chefe esse sujeito, tamanha é sua disposição em coletar informações e se inteirar da situação. Geralmente esse tipo é pouco produtivo. Sua energia é gasta basicamente em coletar informações. Se estiver empregado em algum Sistema Secreto de Informação, esse tipinho progride. Como não há tanto emprego na Agência Brasileira de Informações e a CIA ou o FBI ainda não tem uma seção oficial no Brasil, esse perfil floresce com sucesso apenas no serviço público. Agüentem, Barnabés!

4. “Onipresente”: Não há um colega aqui que não se inclua no perfil anterior. Nessa classe está a maioria dos “curiosos”. Os “Oni”, para os íntimos, são bastante espaçosos. Falam muito. Muito mesmo. Inverte o ditado “Pensar pra falar”. Quando esse tipinho falta no serviço ou vai ao banheiro, não é raro todo mundo suspirar aliviado (infelizmente, pessoas com esse perfil faltam apenas em ocasiões raras, do tipo um-míssil-neozelandês-destruindo-a-Ponte-Rio-Niterói. Quanto a ir ao banheiro, parecem ter rins e intestinos espetacularmente flexíveis).5. “Invejoso”: esse tipo aparece em qualquer função. De serviços gerais aos poderosos Conselhos Executivos de multinacionais. Adoram puxar o tapete do colega. Geralmente são também puxa-sacos (vide tipinho nº 4). Prestam muito mais atenção em você do que no próprio trabalho. No entanto, procura ser dissimulado. Como quer crescer à custa dos outros, sempre procura manter sua imagem de bom mocinho. Nos bastidores, porém, sua língua é ferina e seu comportamento é ofídico. Apronta o maior dos rebuliços e ainda tenta passar uma imagem de anjo. Valha-me Deus…
6. “Puxa-saco”: pensa que estar do lado do chefe é o passo fundamental para ser presidente da ONU. Almeja alto. É eficiente. Geralmente tem a antipatia dos colegas. Enquanto está o atual chefe, sua vida pode até estar arrumada. Complica quando chega chefe novo. Mas como esse tipinho muda de time como muda de roupa, em segundos já está puxando saco do novo superior. É a pior forma de se dar bem no serviço.7. “Pessimista”: se você precisa de palavrinhas para deixar de boa sua auto-estima, por favor, fique a quilômetros desse tipo. Avise-o que você ganhou R$5.000.000,00 na loteria, ele te lembrará do enorme valor a ser pago ao Fisco. Lhe dirá ainda que aumentará em 325% o risco de ser assaltado, 560% de ser vítima de latrocínio. Dirá ainda que é uma vergonha alguns concentrarem tanta grana quando existem milhares e milhares de crianças passando fome. Agora, se você deseja converter esse “pessimista” em um bacaninha “otimista”, cede seu prêmio a ele…

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Se identificou algum colega, parabéns. Você é normal. Se conseguiu identificar algum coleguinha em mais de três tipos, agradeça aos céus. Não há limbo adequado como estágio para sua chegada ao paraíso. Despreocupe-se: as chances são remotas de se divertir lá embaixo, mergulhado no lago de enxofre junto com o Coisa-Ruim. Lembranças a São Pedro, OK?

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P.S. 1: a falta de auto-crítica me impossibilitou de identificar outro tipo de colega chato. Os chatólogos provaram, por a + b, que os observadores de chatos são os maiores dessa espécie já encontrados na natureza (e isso que é auto-conhecimento por excelência). Não obstante, foram os últimos a serem catalogados – talvez por absoluta falta de espelho. A tática usada por esse grupo é conhecida como ‘create a scarecrow‘. Sim, um disfarce para a chatice, implícita em quase todas as sete qualidades anteriores. Em doses micrométricas, modéstia à parte.

P.S. 2: Nessa taxonomia, meu amigo Afonso não justifica seu famoso epíteto.

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