Realidade

O massacre na boate Bataclan demole o sonho de convivência solidária e respeitosa. A alteridade é um sonho desfeito pela crua realidade. Não há novidade. Os extremismos acompanham o homem desde a pré-história. A violência também.

Coldplay homenageou as vítimas do ataque com uma versão de Imagine, composta por John Lennon há quase quarenta anos e, ao que parece, destinada a ser uma canção atemporal. Daqui mil anos Imagine terá o mesmo efeito.

Realidade é realidade. Sonho é sonho. A realidade oprime o sonho. Em sua crueza, a realidade põe o sonho na condição de uma dispensável fantasia.

“You may say, I’m a dreamer
But I’m not the only one”

Pobre Lennon. Mark Chapman pôs fim ao seu sonho. E o sonhador partiu em meio a uma poça de sangue na 72th Street. Sozinho. Melancólico, para dizer o mínimo. A realidade não preza pela poesia ao por fim aos sonhos.

Música

A música é muito importante, disso não há dúvida. Entretanto, música não é essencial, como não são essenciais nenhuma das artes. A arte é especificidade humana, dignifica o homem e o diferencia dos animais. Mas, repito, música não é essencial. Para quem está no castelo e, eventualmente, sua trupe de música não executa sua música favorita, certamente achará a música mais fundamental que ela é. Para quem vive na miséria e distante dos bons modos da high society, essencial é sobreviver e… sonhar. Música é supérflua. Comida não. Roupa não. Sonho não.

Greve nos Institutos Federais

Voltamos ao trabalho depois de mais de dois meses em greve. Internamente, o resultado foi bastante positivo, principalmente porque possibilitou, nas assembleias, a exposição pública dos diferentes interesses e visões sobre educação, como um todo, e sobre os Institutos, em particular.

Estupefato, assisti a defesas da expansão dos Institutos Federais, no geral feita a toque de caixa e no atropelo; escutei gente de peso na minha instituição dizer que o básico para uma aula funcionar é o professor, um quadro e dezenas de alunos… entre outras pérolas.  Enfim, tais discursos funcionam como um balde de água fria para quem se entusiasmava com a ideia de que os Institutos se sustentariam “na conjugação de conhecimentos técnicos e tecnológicos”.

O pressuposto básico, inclusive indicado nominalmente pelos Institutos, é o apelo à articulação institucional entre Ciência, Tecnologia e Educação. Não consigo ver, nesse momento e no geral, uma política consolidada de ciência e de tecnologia nos Institutos Federais. O próprio entendimento do que seja “educação” – tratada como uma equação composta de Professor, Giz e Aluno – reflete bem a pequenez dos Institutos frente aquela já desenvolvida em diversas escolas públicas estaduais e municipais no Brasil.

No meu campus, por exemplo, a internet – essa coisa minimamente básica – oscila e não é confiável. Laboratórios? Corre o risco de formar turmas dos cursos superiores sem terem a oportunidade de fazer experimentos e demonstrações científicas em laboratório. Mais do que questionar a dedicação e esforço desse ou daquele dirigente – e aí falando da instância local – está a crítica a uma política de expansão que poderia ser acompanhada, em mesma rapidez, do aporte financeiro necessário para tal empreendimento.

Sobre reivindicações salariais

Reposição salarial era apenas uma das doze reivindicações grevistas. No entanto, era, talvez, o ponto de negociação que mais esbarrava na  absoluta inflexibilidade do atual governo.

Por exemplo: ao se negar receber os representantes sindicais em reunião para debater o Plano de Carreira (estavam presentes o Andes e o Proifes, representando professores das universidades federais), o Ministério do Planejamento repetia ad nauseam que não negociava com grevistas. Para um governo que teve suas origens no sindicalismo de enfrentamento – e, por isso, pagaram alto preço, como a prisão de vários líderes – a gestão petista da Sra. Dilma é extremamente CONTRADITÓRIA.

No mais, não se reivindicava aumento salarial; o que se pedia era uma reposição das perdas salariais em função da inflação anual. Todo trabalhador  tem que ter esse direito garantido. A gestão federal  do Partido dos Trabalhadores, no entanto, não se sensibilizou com um problema típico dos… trabalhadores.

Pois bem. Greve findada, o que todo trabalhador espera é o cumprimento do Governo do indicativo de que as negociações se iniciem. Negociações que reflitam, sobretudo, a imperiosa necessidade de valorização da educação, não mais como discurso eleitoreiro, mas como efetiva política pública.

Sobre o finado Kadafi

Com comentários rapidinhos sobre a violenta morte de Kadafi, ninguém no Manhattan Connection – meu programa predileto de comentários sobre o noticiário internacional – tocou no que, pra mim, é essencial: encerrar uma estupidez (o governo ditatorial de Kadafi) com outra estupidez (um assassinato) só evidencia a bestialidade dos rebeldes. Seria, na prática, uma troca de seis por meia dúzia no comando líbio. Os dois grupos (Kadafi e rebeldes) se identificam pelo tratamento dado aos inimigos políticos. O abjeto filme, retratando um Kadafi trôpego e banhado em seu próprio sangue, é surreal. É o fim de qualquer versão romântica dos rebeldes e da versão líbia de uma tal “primavera árabe“.

O ENEM 2010: sucesso ou fracasso?

Ora, se você está acompanhando o noticiário nacional não terá a mínima dúvida de que a resposta, para essa pergunta, aponta para um estrondoso desastre. O celeuma criado em torno de algumas provas com problemas tem consumido páginas e páginas de jornais, horas e horas nos rádios e tv’s.

Esquecem, no entanto, de ressaltar o fato de que os problemas se restringiram a 0,06 do total de provas. Isto é, 99,94% dos cadernos de prova estavam absolutamente corretos. Isso não parece ser suficiente para a parcial imprensa brasileira…

Universidades e seus concursos

Recebi, algum tempo atrás, um apaixonado e-mail de uma candidata inconformada com o resultado de um concurso público de uma universidade federal. Reclamava, entre outras coisas, da extrema subjetividade que campeia nesses concursos.

Até aí, tudo bem. Todo mundo tem direito – e obrigação, nesse caso – de denunciar e espernear quando se sentem injustiçados. Mas vamos, prosseguindo, divagar sobre algumas curiosidades desse esperneio.

De imediato, o que me espanta é o grito de uma doutora. Em tese, pressupõe que a mesma viveu por longos e longos anos em ambientes universitários. Por conseguinte, é de se assombrar o fato de que, somente agora, a candidata se deu conta que os processos seletivos em universidades são, em sua maioria, bastante… subjetivos.

Ora, comecemos pelas coisas mais simples: a seleção para alunos bolsistas. No geral, o professor convida um aluno, e o aspecto subjetivo – a empatia entre professor e aluno – é um dos aspectos fundamentais nessa escolha. Isto é, o desempenho acadêmico é insuficiente para o sucesso do estudante.

Portanto, não basta você ser uma promessa de gênio. Se constar traços de empáfia, arrogância ou qualquer outro atributo que não condiz com a versão idealizada de um bom estudante, pior pra você.

Para as seleções posteriores, o grau de subjetividade diminui um pouco, é verdade, mas continua ainda sendo um critério relevante. Para mestrados e doutorados, o seu currículo, projeto e desenvoltura numa prova escrita são pouco quando se tem uma entrevista como etapa de seleção. É nessa etapa que, novamente, a subjetividade conta. O histórico de parceria na vida acadêmica entre professor e candidatos é, portanto, fundamental.

Resumindo: ao concorrer, em mestrados e doutorados, com alunos que já foram orientados ou tiveram qualquer outra relação acadêmica com o professor, o resultado não oferecerá surpresa.

Mas, evidentemente, a doutora – aquela, lá do começo do texto – “desconhece” toda a subjetividade que povoa a universidade. Como boa brasileira, só reclama quando a ordem das coisas a prejudica. Até alcançar seu título de doutora, todos esses procedimentos eram “naturais”. Mas quando resolve fazer concursos fora de seu casulo habitual (as universidades que convalidam seus títulos), aí a boca geme e grita.

Exemplo bastante simples desse processo viciado é o fato de que as universidades têm, em seus quadros, professores que se graduam e se doutoram na mesma instituição. São favorecidos por essas “boas políticas” durante todo seu percurso acadêmico.

Reclamar apenas quando o “sistema” lhe prejudica é bastante casuístico e, no limite, fortemente imoral.

Mayara Petruso, nordestinos afogados e o medo na cidade

Findadas as eleições, os ânimos continuam acirrados. Eleitores de Serra acreditam que os nordestinos foram responsáveis pela eleição da nova presidente do Brasil. Uma bobagem, já que, excluídos os votos do Nordeste, o resultado da eleição presidencial seria o mesmo. No entanto, nesse barco preconceituoso já embarcou uma multidão louca para achar nos nordestinos um bode expiatório. No fundo, há um incontido horror pela escolha presidencial ser definida pela massa pobre e desvalida de brasileiros – que, para a elite branca paulistana, recebe o nome de “nordestino”. Pobre não deveria votar é a lógica implícita.

Sobre a análise do caso dessa avalanche de preconceito contra os nordestinos desencadeada pelo “desabafo”, via twitter, da jovem Mayara Petruso, recomendo o texto excelente publicado no Blog do Rovai. No que concordo, aliás, integralmente. É o melhor texto que li sobre toda essa confusão. São os mesmos fascistinhas, como ela, que gritam histericamente, na internet, contra as históricas conquistas no Brasil desses últimos anos.

Coincidentemente, estava lendo “Confiança e medo na cidade”, de Zygmunt Bauman. Lá no seu terceiro capítulo (uma transcrição de palestra, na verdade), Bauman escreve sobre “gente supérflua”. Embora faça referência às migrações populacionais em solo europeu, pode, também, ser apropriadamente utilizada para análise desse preconceito estúpido (foi mal o pleonasmo) manifestado pela paulistana e acompanhado por muita gente.

Diz Bauman:

Desde o ínicio, a modernidade produz ‘gente supérflua’ – no sentido de que é inútil, de que suas capacidades produtivas não podem ser exploradas de maneira profícua. Para falar de forma mais brutal, sem meios-termos, para as ‘pessoas de bem’, seria melhor que essas outras pessoas desaparecessem de vez. (…) Como todos sabem, o conceito de superfluidade não implica qualquer promessa de melhora, de remédio, de indenização. Não, nada disso. Uma vez supérfluo sempre supérfluo” (p. 80).

Sem remédio, sem melhora: a saída que uma parte da elite desse país consegue ver a sua frente é afogar, sem piedade, os miseráveis desse país.

Picaretagem

Muitos blogs por aí (Sedentário, Um passinho a frente, Brainstorm9, Zebra da hora, Blog do Rovai – entre outros)  já divulgaram a excêntrica campanha do candidato a deputado federal Jeferson Camillo, do Partido Progressista (SIC!) de São Paulo. Tratam-se de diversos vídeos com conteúdo sexual, de um lado, e um “jingol” (SIC!!!) evangélico, de outro. Algo como acender uma vela para Deus e outra para o demônio, sei lá.

O que poucos lembram é que o indivíduo desejoso de se tornar um ilustre deputado participou de uma farsa que alcançou os noticiários nacionais (veja aqui no JB, O Globo e Terra). Em 2009, um tal Instituto Gomes Pimentel premiava mais de cem instituições de ensino. À época, noticiou-se que o prêmio saía por até dois mil reais. Isto é, as instituições de ensino – muitas delas medíocres –  pagavam por um prêmio que, aos olhos da sociedade, era um reconhecimento ao suposto excelente desempenho auferido.

Como se isso não bastasse, um vídeo postado pelo próprio Jeferson Camillo (abaixo) atesta outra pilantragem. Nos primeiros segundos do vídeo, a logo do Governo Federal aparece, sugerindo supostos apoio e avalização do evento. Apresentado como “representante do MEC”, o hoje candidato fez referência ao ministro, bizarramente chamado de Fernando “Hadades”. O MEC, claro, disse desconhecer o senhor Camillo.

No site de campanha, ele se diz preparado para ser deputado federal. Com esse histórico recente, eu, sinceramente, não duvido…

Tolos

Torcedores do “coxa”, por arrebentarem seu próprio estádio;

Torcedores do Flamengo, por brigarem entre si;

Estudantes ocupantes da Câmara Legislativa do DF, por impedir os trabalhos dos deputados (e, por consequência, retardando o opróbrio dos queridos homens públicos. ‘Compulsoriamente’ escondidos em seus recantos privados, ficam eximidos de se explicarem das ações absurdamente vis assistidas exaustivamente em rede nacional).

Pra ser tolo, basta uma dose de irracionalidade.